domingo, 8 de fevereiro de 2009

As lentes do Evangelho








Meu amigo, estas são as roupas que consegui arranjar para você. Por favor, leve-as, mas não faça barulho para não assustar minhas irmãs, que estão apavoradas...



Este inusitado bilhete foi escrito por Chico, deixado com uma trouxa de roupa no alpendre de sua casa.

É que no dia anterior, um amigo do alheio levara as roupas que estavam no varal. Certamente, neófito na “arte” do furto, fizera barulho no quintal, apavorando as irmãs do médium. Daí o seu pedido para que fosse cuidadoso.

Obediente, o “visitante furtivo” recolheu a dádiva com cuidado, guardando silêncio.

Com a bondade que o caracterizava, Chico identificou não o larápio que deveria ser abominado e castigado, mas o irmão que precisava de ajuda.

Se usarmos as lentes do Evangelho, perceberemos que a motivação maior dos criminosos é a necessidade.

Sem uma educação adequada, sem bons exemplos no lar, o carente vê na marginalidade a melhor possibilidade de resolver seus problemas.

Destaque-se, nesse particular, o abençoado trabalho das instituições filantrópicas, as associações de moradores, as organizações religiosas que atendem favelas e vilarejos paupérrimos, reduzindo a criminalidade.

Muito mais se fará, quando a população ativa, na classe média e abastada, envolver-se com esse trabalho, combatendo a miséria que cresce na periferia, a fim de que não se derrame sobre a cidade, em ondas de violência.



* * *



Você dirá, leitor amigo, que há facínoras que mais parecem feras, a agir sem o mínimo respeito pela vida humana. Estes certamente precisam dos rigores da justiça, mas representam uma minoria.

A vasta maioria dos criminosos é constituída de pessoas de poucas letras, sem discernimento e mal orientadas, que podem mudar de rumo ou evitar desvios maiores, se estivermos dispostos a ajudá-las, exercitando a misericórdia, virtude evangélica sempre esquecida quando lidamos com aqueles que nos causam prejuízos.

E ainda que sigam sua sina, atendendo à própria imaturidade e às tendências milenarmente cultivadas, teremos depositado em suas almas atormentadas as sementes do Bem.

Mais cedo ou mais tarde, elas germinarão, a inibir seus impulsos agressivos, estimulando-os ao esforço da própria renovação.



* * *



Aqueles que passaram pela experiência dramática de um assalto à mão armada ou por um simples furto, experimentam, normalmente, dificuldade em enxergar no criminoso um irmão em necessidade.

Encaram-no como alguém que perdeu a humanidade, uma fera perigosa que deveria ser sumariamente eliminada.

Essa reação nos oferece a medida exata de como estamos distanciados dos valores evangélicos.

Diz Jesus:



... Se alguém vos bater na face direita, oferecei-lhe também a outra (Mateus, 5:39)



... Se alguém vos obrigar a caminhar uma milha, ide com ele duas... (Mateus, 5:41)



... Perdoai não sete vezes, mas setenta vezes sete (Mateus 18:22)



Enquanto essas recomendações constituírem meras palavras para nós; enquanto estagiarem efemeramente em nosso cérebro, sem descer ao coração, teremos muita dificuldade para lidar com situações dessa natureza.

Mas vamos aprendendo que não estaremos fazendo favor ao criminoso, se nos dispusermos a cumprir o Evangelho. Apenas o mínimo necessário para que sigamos em frente, sem traumas maiores, capazes de paralisar ou comprometer nossa existência.



Richard Simonetti – Rindo e Refletindo com Chico Xavier

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