quarta-feira, 1 de agosto de 2007

DIÁLOGOS COM AS SOMBRAS - Hermínio C.Miranda



O DIRIGENTE DAS TREVAS

Esta é uma figura freqüente nos trabalhos de desobsessão. Comparece para observar, estudar as pessoas, sondar o doutrinador, sentir mais de perto os métodos de ação do grupo, a fim de poder tomar suas “providências”. Foi geralmente um encarnado poderoso, que ocupou posições de mando. Acostumado ao exercício da auto¬ridade incontestada, é arrogante, frio, calculista, inteligente, expe¬rimentado e violento. Não dispõe de paciência para o diálogo, pois está habituado apenas a expedir ordens e não a debater problemas, ainda mais com seres que considera inferiores e ignorantes, como os pobres componentes de um grupo de desobsessão. Situa-se num plano de olímpica superioridade e nada vem pedir; vem exigir, ordenar, ameaçar, intimidar.
Tais dirigentes são ágeis de raciocínio, envolventes, inescrupu¬losos, pois o poder de que desfrutam não pode escorar-se na do¬çura, na tolerância, na humildade, e sim na agressividade, na des¬confiança, no ódio. Enquanto odeiam e infligem dores aos outros, estão esquecidos das próprias angústias, como se a contemplação do sofrimento alheio provocasse neles generalizada insensibilização.
Evitam descer do pedestal em que se colocam para revelar-nos seus problemas pessoais, mesmo porque, consciente ou inconscien¬temente, temem tais revelações, que personalizam os problemas que enfrentam e os colocam na “perigosa” faixa de sintonia emocional que abre as portas de acesso à intimidade do ser.
Não são executores, gostam de deixar bem claro, são chefes. Estao ali somente para colher elementos para suas decisões; a exe¬cução ficará sempre a cargo de seus asseclas. Comparecem cerca¬dos de toda a pompa, envolvidos em imponentes “vestimentas”, portando símbolos, anéis, indicadores, enfim, de “elevada” condição. Estão rodeados de servidores, acólitos, guardas, escravos, assessores, às vezes “armados”, “montados” em “animais” ou transportados sob “pálios”, como figuras de grandes sacerdotes e imperadores.
Um deles me disse, certa vez, que eu não o estava tratando com o devido respeito — o que não era verdadeiro — porque achava impertinentes minhas perguntas e comentários. Para me dar uma idéia da sua grandeza, informou-me que, quando se des¬locava, iam à frente dele áulicos, tocando campainhas portáteis, para que todos abrissem alas e soubessem quem vinha.
Pobre irmão desorientado! Num irresistível processo de regres¬são de memória, invisível aos nossos olhos, mas de tremendo rea¬lismo para ele, contemplou, com horror, sua antiga condição: par¬ticipara do doloroso drama da Crucificação do Cristo. O impacto desta revelação, ou seja, desta lembrança, que emergiu, incontro¬lável, dos registros indeléveis do seu perispírito, deixaram-no em estado de choque e desespero, pois vinha nos afirmando, desde a primeira manifestação, que era um dos trabalhadores do Cristo e não desejava senão restabelecer o poderio da “sua” Igreja.

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